segunda-feira, 20 de dezembro de 2010

Torna-te quem tu és!






Dezembro é inevitável. Por mais envolvidos no turbilhão gerado pela expectativa de mais um final de ano, sempre rola a famosa retrospectiva. E lá vamos nos recorrer ao bom e velho bloquinho de notas da memória, verificar entre risos e lágrimas o balanço final.


Entre as fatias da nossa pizza, vamos contabilizar as oportunidades profissionais, os lugares que descobrimos,  amigos que ganhamos, os que perdemos ou se perderam em alguma curva... palavras ditas, pedras atiradas, amores pela metade, amores recorrentes... sorrisos, suspiros, lágrimas, latidos e uivos.

É. Tarefa complicadinha essa. Isso porque nem sempre olhar para trás é seguro - Requer coragem, determinação e disposição para uma revista interna. Olhar no espelho além da imagem refletida, pode nos tirar da zona de conforto e do prumo. Pode gerar ansiedade, arrepios, choros inexplicáveis e repentinos. Pode nos levar a lugares que nunca estivemos. Cruzar barreiras, fronteiras, portas. Pode construir pontes. Pode derrubá-las – Pode ser que você nunca mais seja o mesmo(a).

Entretanto, esses ‘rituais” são de grande importância pois nos proporcionam crescimento. Essa nova casca quando gerada a partir de um sentimento de aceitação da verdade, nos conecta com nossa natureza mais selvagem. Nos conecta com quem somos. Cura e liberta. Faz retornar a vontade original e inocente presente nas crianças. Nos faz andar mais leves, perdoar, rir de si mesmo e ansiar o momento em que a chuva caia...


Neste final de ano, desejo que sua alma mergulhe no espelho, e lhe apresente uma pele novinha em folha!

sábado, 16 de outubro de 2010

Pequena história de (des)amor

Eles se conheceram em fevereiro, era carnaval. Divertiram-se muito embriagados de samba e harmonia. Correram no salão como quem tem pressa pra ser feliz. Abraçaram e beijaram-se como se nunca o tivessem feito antes. Grudaram-se como seiva de bananeira.

Foram vivendo e aprendendo a se amar e odiar. Aprenderam como era conviver com alguém que divide quase tudo, tolerar quando não se queria dividir nada, e acalmar quando nada mais podia ser feito.

Eles diziam estar apaixonados. Ela dizia que ele era tudo que sonhava. Ele dizia que queria se casar. Ela dizia que iria envelhecer ao seu lado, ele dizia que queria ter filhos.

Ele dizia vamos construir castelos, ela dizia não vamos derrubá-los. Ele dizia conquistamos um sonho, ela dizia, cuidado que nosso sonho pode virar pesadelo. Ele dizia, praia, ela campo.

Ele pegava a direita, ela dizia, porque você pegou a direita? Ela dizia porra, pega a esquerda, ele dizia, caralho tu não sabe onde é! Ela dizia tu sempre te perde. Ele dizia, lá vem tu com esse papo. Ela dizia corno. Ele palhaça.

Eles se amaram e se amarraram por longos anos. Viveram como que uma vida toda um ao lado do outro.

Ele dizia nós somos dois bicudos. Ela dizia é só não ficarmos frente à frente. Ele dizia não sinto, ela dizia sinto muito.

Ela foi pra esquerda. Ele foi pra direita.

Eles se desconheceram em agosto, era sexta-feira 13.

By Luz Chaves

segunda-feira, 22 de março de 2010


JOAQUÍN PASOS

(1914-1947)








POEMA EN PIE

¿Qué actitud, qué gallarda pose original se puede tomar
ante la proximidad de este poema?
Te lo pregunto a ti, ¡Oh hábil diseñadora de nuevas sonrisas!
         la única
que puede ofrecerme en un plan de cinco minutos la más
          conveniente arquitectura de mi genio actual.

Decían los maestros chinos de la dulce poesía
que el poeta quedaba enfermo y ojeroso después del transe
         amargo;
pero yo te suplico, bondadosa musilla de ojos ingenuos
que no hagas que mi miel sea elaborada a cosas de mi
         sangre,
porque mucha sangre se ha desperdiciado últimamente y
         andan escasos de leche los pechos de las madres.

Un poema que sale a pie, y como está inédito, yo le digo:
         Hasta que te vea te creo,
Pretendo primero, sacudirme de encima estas alas de ángel
         que me agobian,
a ver si botando todas esa pluma quedo con la ternura
         virginal del pollo
o siquiera con algo de ese equilibrio inestable de lo que
         da risa,
tan lleno de emoción y de lágrimas como el cristal que
         ya va a caer
y no cae, peo que sabe que ya va a caer.



LOS INDIOS VIEJOS

Los hombres viejos, muy viejos, están sentados
junto a sus cabras, junto a sus pequeños animales mansos.
Los hombres viejos están sentados junto un río
que siempre va despacio.
Ante ellos el aire detiene su marcha,
el viento pasa, contemplándolos,
los toca con cuidado
para no desbaratarles sus corazones de ceniza.

Los hombres viejos sacan al campo sus pecados,
Éste es su único trabajo.
Los sueltan durante el día, pasan el día olvidando,
y en la tarde salen a lazarlos
para dormir con ellos calentándose.


CANTO DE GUERRA DE LAS COSAS

(fragmentos)

Cuando lleguéis a viejos, respetaréis la piedra,
si es que llegáis a viejos,
si es que entonces quedó alguna piedra.
Vuestros hijos amarán al viejo cobre,
al hierro fiel.
Recibiréis a los antiguos metales en el seno de vuestras familias,
trataréis al noble plomo con la decencia que corresponde a su
carácter dulce;
os reconciliaréis con el zinc dándole un suave nombre;
con el bronce considerándolo como hermano del oro,
porque el oro no fue a la guerra por vosotros,
el oro se quedó, por vosotros, haciendo el papel de niño mimado,
vestido de terciopelo, arropado, protegido por el resentido acero...
Cuando lleguéis a viejos, respetaréis al oro,
si es que llegáis a viejos,
si es que entonces quedó algún oro.

El agua es la única eternidad de la sangre.
Su fuerza, hecha sangre. Su inquietud, hecha sangre.
Su violento anhelo de viento y cielo,
hecho sangre.
Mañana dirán que la sangre se hizo polvo,
mañana estará seca la sangre.
Ni sudor, ni lágrimas, ni orina
pondrán llenar el hueco del corazón varío.

(...)

Todos los ruidos del mundo forman un gran silencio.
Todos los hombres del mundo forman un solo espectro.
En medio de este dolor, ¡soldado!, queda tu puesto
vacío o lleno.
Las vidas de los que quedan están con huecos,
tienen vacíos completos,
como si se hubieran sacado bocados de carne de sus cuerpos.
Asómate a este boquete, a este que tengo en el pecho,
para ver cielos e infiernos.
Mira mi cabeza hendida por millares de agujeros:
a través brilla un sol blanco, a través un astro negro.
Toca mi mano, esta mano que ayer sostuvo un acero:
puedes pasar en el aire, a través de ella, tus dedos!
He aquí la ausenda del hombre, la ausenda de carne, miedo,
días, cosas, almas, fuego.
Todo se quedó en el tiempo. Todo se quemó allá lejos.



domingo, 7 de março de 2010

Bom conselho - Chico Buarque - 1972

Ouça um bom conselho
Que eu lhe dou de graça
Inútil dormir que a dor não passa
Espere sentado
Ou você se cansa
Está provado, quem espera nunca alcança

Venha, meu amigo
Deixe esse regaço
Brinque com meu fogo
Venha se queimar
Faça como eu digo
Faça como eu faço
Aja duas vezes antes de pensar

Corro atrás do tempo
Vim de não sei onde
Devagar é que não se vai longe
Eu semeio vento na minha cidade
Vou pra rua e bebo a tempestade


quinta-feira, 18 de fevereiro de 2010

Fábulas

Por Mauro Siqueira
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Ela era uma princesa, como muitas dessas por aí... a sua adversidade era a de dormir e dormir e dormir (narcolepsia?) até que o Belo Príncipe a despertasse com o beijo sincero do amor sincero. Anos e anos se passaram até que o tal se apresentasse, era o ano de 2009.
Observou as heras e vinhas, espinhos, liquens, musgos que guardavam o seu catre. Uma menina inocente. Ele se aproximou e ficou fatalmente encantado, tocou-lhe o rosto sereno com cuidado... o cabelo louro numa mecha crescida cobria os olhos e descia até tocar o chão de um mármore agora velho. Com a ponta dos dedos, tocou-lhe os lábios róseos com cuidado: parecia... morta. Deu tapinhas no rosto. Parecia morta. Mais fortes. Parecia morta. “Ei?” Parecia morta. A bela princesa era muito bonita e bem feita. Parecia morta. (narcolepsia?) Suas roupas fora de moda estavam apertadas e gastas, rasgando e puindo em várias partes – os ombros e braços à mostra, os tornozelos e canelas, o colo à mostra. A princesa crescera naquele cárcere de panos e rendas.
O Belo Príncipe nunca amara, nunca tivera um amor vivo (necrofilia?), ninguém desse mundo lhe dava prazer (necrofilia?) saiu aí, no mundo, numa busca muda e intempestiva, no seu Mustang® branco.
Tocou-a, quase sem tocar, apenas passeando com a mão, os ombros, os braços, os tornozelos, as canelas, parecia morta. Parecia morta... Passou a sua mão mais uma vez por aquele rosto cândido e aqueles lábios pios; inclinou-se, quase lhe tocando, disse no afã de ser ouvido: “I wish I could eat the salt of your lost and fading lips.”
O som que fazia era excitante: as roupas praticamente se desfaziam ao toque de tão velhas que estavam: tocou-lhe os seios. E todo o resto. (Mas não lhe deu nenhum beijo.)
Como num arpejo, seus movimentos, não simultâneos, mas muito sincronizados e disciplinados davam contam dos seus intentos – afinal, era um príncipe. Não parou até os homens de branco do sanatório perceberam mais uma vez a ausência dele, o necrófilo, e irromperem pelo quarto da menina narcoléptica e o arrancarem com autoridade e vigor de lá, não sem muita diligência e trâmite, aplicando inúmeras seringas no seu pescoço e braços até ele adormecer.
A bela, ali adormecida, não acordou. Já não era mais uma princesa inocente, cândida e pura e... e aquela lágrima que brotara silenciosa, tão muda quanto ela, não podia dizer nada, deixando àqueles que escrevem a incumbência de (re)contar essa bela história pelo tempo.  o-bule - Mauro Siqueira



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terça-feira, 9 de fevereiro de 2010

Pena - O Teatro Mágico


O poeta pena quando cai o pano
E o pano cai
Um sorriso por ingresso
Falta assunto, falta acesso
Talento traduzido em cédula
E a cédula tronco é a cédula mãe solteira
O poeta pena quando cai o pano
E o pano cai
Acordes em oferta, cordel em promoção
A Prosa presa em papel de bala
Música rara em liquidação
E quando o nó cegar
Deixa desatar em nós
Solta a prosa presa
A Luz acesa
Lá se dorme um sol em mim menor
[Eu sinto que sei que sou um tanto bem maior]
O palhaço pena quando cai o pano
E o pano cai
A porcentagem e o verso
A rifa, a tarifa e refrão
Talento provado em papel moeda
Poesia metamorfoseada em cifrão
O palhaço pena quando cai o pano
E o pano cai
Meu museu em obras, obras em leilão
Atalhos, retalhos, sobras
A matemática da arte em papel de pão
E quando o nó cegar
Deixa desatar em nós
Solta a prosa presa
A luz acesa
Já se abre um sol em mim maior

[Eu sinto que sei que sou um tanto bem maior]

 http://oteatromagico.mus.br/

segunda-feira, 1 de fevereiro de 2010

"Um homem jamais pode entender o tipo de solidão que uma mulher experimenta. Um homem se deita sobre o útero da mulher apenas para se fortalecer, ele se nutre desta fusão, se ergue e vai ao mundo, a seu trabalho, a sua batalha, sua arte. Ele não é solitário. Ele é ocupado. A memória de nadar no líquido aminótico lhe dá energia, completude. A mulher pode ser ocupada também, mas ela se sente vazia. Sensualidade para ela não é apenas uma onda de prazer em que ela se banhou, uma carga elétrica de prazer no contato com outra. Quando o homem se deita sobre o útero dela, ela é preenchida, cada ato de amor, ter o homem dentro dela, um ato de nascer e renascer, carregar uma criança e carregar um homem. Toda vez que o homem deita em seu útero se renova no desejo de agir, de ser. Mas para uma mulher, o climax não é o nascimento, mas o momento em que o homem descansa dentro dela."
Anais Nin

sábado, 30 de janeiro de 2010

O beijo

Bocas que se procuram
como animais no cio

entrelaçando suas patas
na ânsia inexata do êxtase

lábios
escondem entre dentes
palavras úmidas

mordem o canto esquerdo
do desejo

línguas como tentáculos
sugam a saliva

que escorre lenta
doce
e repousa nos lençóis vermelhos da carne

terça-feira, 5 de janeiro de 2010

(O desespero da piedade)

Meu senhor, tende piedade dos que andam de bonde
E sonham no longo percurso com automóveis, apartamentos...
Mas tende piedade também dos que andam de automóvel
Quando enfrentam a cidade movediça de sonâmbulos, na direção.
Tende piedade das pequenas famílias suburbanas
E em particular dos adolescentes que se embebedam de domingos
Mas tende mais piedade ainda de dois elegantes que passam
E sem saber inventam a doutrina do pão e da guilhotina.
Tende muita piedade do mocinho franzino, três cruzes, poeta
Que só tem de seu as costeletas e a namorada pequenina
Mas tende mais piedade ainda do impávido forte colosso do esporte
E que se encaminha lutando, remando, nadando para a morte.
Tende imensa piedade dos músicos dos cafés e casas de chá
Que são virtuoses da própria tristeza e solidão
Mas tende piedade também dos que buscam silêncio
E súbito se abate sobre eles uma ária da Tosca.
Não esqueçais também em vossa piedade os pobres que enriqueceram
E para quem o suicídio ainda é a mais doce solução
Mas tende realmente piedade dos ricos que empobreceram
E tornam-se heróicos e à santa pobreza dão um ar de grandeza.
Tende infinita piedade dos vendedores de passarinhos
Que em suas alminhas claras deixam a lágrima e a incompreensão
E tende piedade também, menor embora, dos vendedores de balcão
Que amam as freguesas e saem de noite, quem sabe onde vão...
Tende piedade dos barbeiros em geral, e dos cabeleireiros
Que se efeminam por profissão mas que são humildes nas suas carícias Mas tende mais piedade ainda dos que cortam o cabelo:
Que espera, que angústia, que indigno, meu Deus!
Tende piedade dos sapateiros e caixeiros de sapataria
Que lembram madalenas arrependidas pedindo piedade pelos sapatos
Mas lembrai-vos também dos que se calçam de novo
Nada pior que um sapato apertado, Senhor Deus.
Tende piedade dos homens úteis como os dentistas
Que sofrem de utilidade e vivem para fazer sofrer
Mas tende mais piedade dos veterinários e práticos de farmácia
Que muito eles gostariam de ser médicos, Senhor.
Tende piedade dos homens públicos e em particular dos políticos
Pela sua fala fácil, olhar brilhante e segurança dos gestos de mão
Mas tende mais piedade ainda dos seus criados, próximos e parentes
Fazei, Senhor, com que deles não saiam políticos também.
E no longo capítulo das mulheres, Senhor, tende píedade das mulheres Castigai minha alma, mas tende piedade das mulheres
Enlouquecei meu espírito, mas tende piedade das mulheres
Ulcerai minha carne, mas tende piedade das mulheres!
Tende piedade da moça feia que serve na vida
De casa, comida e roupa lavada da moça bonita
Mas tende mais piedade ainda da moça bonita
Que o homem molesta – que o homem não presta, não presta, meu Deus!
Tende piedade das moças pequenas das ruas transversais
Que de apoio na vida só têm Santa Janela da Consolação
E sonham exaltadas nos quartos humildes
Os olhos perdidos e o seio na mão.
Tende piedade da mulher no primeiro coito
Onde se cria a primeira alegria da Criação
E onde se consuma a tragédia dos anjos
E onde a morte encontra a vida em desintegração.
Tende piedade da mulher no instante do parto
Onde ela é como a água explodindo em convulsão
Onde ela é como a terra vomitando cólera
Onde ela é como a lua parindo desilusão.
Tende piedade das mulheres chamadas desquitadas
Porque nelas se refaz misteriosamente a virgindade
Mas tende piedade também das mulheres casadas
Que se sacrificam e se simplificam a troco de nada.
Tende piedade, Senhor, das mulheres chamadas vagabundas
Que são desgraçadas e são exploradas e são infecundas
Mas que vendem barato muito instante de esquecimento
E em paga o homem mata com a navalha, com o fogo, com o veneno.
Tende piedade, Senhor, das primeiras namoradas
De corpo hermético e coração patético
Que saem à rua felizes mas que sempre entram desgraçada
Que se crêem vestidas mas que em verdade vivem nuas.
Tende piedade, Senhor, de todas as mulheres
Que ninguém mais merece tanto amor e amizade
Que ninguém mais deseja tanto poesia e sinceridade
Que ninguém mais precisa tanto de alegria e serenidade.
Tende infinita piedade delas, Senhor, que são puras
Que são crianças e são trágicas e são belas
Que caminham ao sopro dos ventos e que pecam
E que têm a única emoção da vida nelas.
Tende piedade delas, Senhor, que uma me disse
Ter piedade de si mesma e de sua louca mocidade
E outra, à simples emoção do amor piedoso
Delirava e se desfazia em gozos de amor de carne.
Tende piedade delas, Senhor, que dentro delas
A vida fere mais fundo e mais fecundo
E o sexo está nelas, e o mundo está nelas
E a loucura reside nesse mundo.
Tende piedade, Senhor, das santas mulheres
Dos meninos velhos, dos homens humilhados – sede enfim
Piedoso com todos, que tudo merece piedade
E se piedade vos sobrar, Senhor, tende piedade de mim!


Vinicius de Morais