segunda-feira, 26 de outubro de 2009

As sem razões do amor





Eu te amo porque te amo.
Não precisas ser amante,
e nem sempre sabes sê-lo.
Eu te amo porque te amo.
Amor é estado de graça
e com amor não se paga.

Amor é dado de graça,
é semeado no vento,
na cachoeira, no elipse.
Amor foge a dicionários
e a regulamentos vários.

Eu te amo porque não amo
bastante ou demais a mim.
Porque amor não se troca,
não se conjuga nem se ama.
Porque amor é amor a nada,
feliz e forte em si mesmo.

Amor é primo da morte,
e da morte vencedor,
por mais que o matem (e matam)
a cada instante de amor.


 Quadrilha

João amava Teresa que amava Raimundo
que amava Maria que amava Joaquim que amava Lili
que não amava ninguém.
João foi para os Estados Unidos, Teresa para o convento,
Raimundo morreu de desastre, Maria ficou pra tia,
Joaquim suicidou-se e Lili casou com J. Pinto Fernandes
que não tinha entrado na história.



Carlos Drummond de Andrade

domingo, 18 de outubro de 2009

...

As ameixas apodreceram ...

sábado, 10 de outubro de 2009

Um pouco de Ana C.



"...não ter posição marcada, idéias, opiniões, fala desvairada.
Só de não ditos ou de delicadezas se faz minha conversa, e para não ficar louca e inteiramente solta neste pântano, marco para mim o limite da paixão, e me tensiono na beira: tenho de meu (discurso) este resíduo. Não tenho idéias, só o contorno de uma sintaxe (= ritmo)."

FAGULHA

Abri curiosa
o céu.
Assim, afastando de leve as cortinas.

Eu queria entrar,
coração ante coração,
inteiriça
ou pelo menos mover-me um pouco,
com aquela parcimônia que caracterizava
as agitações me chamando

Eu queria até mesmo
saber ver,
e num movimento redondo
como as ondas
que me circundavam, invisíveis,
abraçar com as retinas
cada pedacinho de matéria viva.

Eu queria
(só)
perceber o invislumbrável
no levíssimo que sobrevoava.

Eu queria
apanhar uma braçada
do infinito em luz que a mim se misturava.

Eu queria
captar o impercebido
nos momentos mínimos do espaço
nu e cheio

Eu queria
ao menos manter descerradas as cortinas
na impossibilidade de tangê-las

Eu não sabia
que virar pelo avesso
era uma experiência mortal.



Samba-Canção

Tantos poemas que perdi.
Tantos que ouvi, de graça,
pelo telefone – taí,
eu fiz tudo pra você gostar,
fui mulher vulgar,
meia-bruxa, meia-fera,
risinho modernista
arranhando na garganta,
malandra, bicha,
bem viada, vândala,
talvez maquiavélica,
e um dia emburrei-me,
vali-me de mesuras
(era comércio, avara,
embora um pouco burra,
porque inteligente me punha
logo rubra, ou ao contrário, cara
pálida que desconhece
o próprio cor-de-rosa,
e tantas fiz, talvez
querendo a glória, a outra
cena à luz de spots,
talvez apenas teu carinho,
mas tantas, tantas fiz...

Ana Cristina Cesar

sexta-feira, 9 de outubro de 2009

Duas canções de silêncio

Ouve como o silêncio
Se fez de repente
Para o nosso amor

Horizontalmente...

Crê apenas no amor
E em mais nada
Cala: escuta o silêncio
Que nos fala
Mais intimamente: ouve
Sossegada
O amor que despetala
O silêncio...

Deixa as palavras a poesia...


Vinicius de Moraes